Comportamento
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07.03.13
Saúde pede socorro
por Talita Boros

Bem avaliada pelo governo federal, rede pública de saúde do Paraná apresenta problemas.

Saúde pede socorro
Demora no atendimento é uma das reclamações mais comuns entre os usuários do SUS em todo o Estado Crédito: Sismuc
Irritado com a demora no atendimento, homem quebrou computadores na Unidade de Saúde Salvador Allende, no Bairro Novo, no início deste ano Crédito: Sismuc
Usuários aguardam atendimento em Unidade de Saúde de Curitiba Crédito: Sismuc
A família de José Rodrigues Cabral, de 80 anos, luta na Justiça para provar que sua morte foi decorrente de erro médico Crédito: arquivo pessoal
Nos últimos seis meses, o Paraná teve 2.595 casos de dengue confirmados Crédito: Joel Rocha/SMCS

Apesar de bem avaliada pelo governo federal, rede pública de saúde do Paraná ainda está longe de ser eficiente e usuários sofrem com demora no atendimento e erros médicos. Estado enfrenta agora epidemia de dengue

No ano passado, o Sistema Único de Saúde (SUS) do Paraná foi avaliado como o segundo melhor do País, em análise feita pelo Ministério da Saúde. Atrás apenas de Santa Catarina, o Estado alcançou a nota 6,23, bem acima da média nacional de 5,47. Foi a primeira vez que a rede pública brasileira foi avaliada pelo acesso e a qualidade dos serviços.

O Índice de Desempenho do SUS (Idsus) aferiu o atendimento em todos os municípios e estados de acordo com uma escala de 0 a 10. Entre as capitais, Curitiba teve a segunda melhor nota, sendo superada apenas por Vitória.

Apesar da nota positiva, ainda falta muito. Usuários reclamam da demora na marcação de consultas nos postos de saúde, assim como em atendimentos de emergência. Em pesquisa realizada em julho do ano passado pelo Instituto Datafolha, a saúde foi apontada como principal problema da cidade por 37% dos curitibanos, na frente da segurança, considerada como maior desafio por 31% da população.

Hoje a grande maioria da população – cerca de 70% - depende exclusivamente do SUS, ou seja, a maior parte dos curitibanos não possui plano de saúde e conta apenas com a rede pública quando necessita de atendimento médico. No restante do Paraná a situação não é diferente e o sistema é ainda mais sobrecarregado.

 

Problemas se concentram na atenção básica

Apesar de reconhecer a melhora no atendimento na rede pública nos últimos anos em todo o Estado, Fernanda Nagl Garcez, promotora de Proteção à Saúde do Ministério Público do Paraná (MP-PR), aponta que as grandes falhas do sistema acontecem justamente na atenção básica, serviço que a parcela mais carente da população mais utiliza.

“Nos atendimentos de alta complexidade, como transplantes e tratamento oncológico, por exemplo, o SUS é muito eficiente. Onde a classe média não está, na atenção básica, é onde o sistema é falho”, explica.

Essa falha no atendimento primário, em postos de saúde, acaba sobrecarregando hospitais e emergências. “É comprovado que 80% dos problemas de saúde podem ser resolvidos na atenção básica. Se ela não anda bem, todo o restante do sistema fica sobrecarregado”, diz.

Segundo ela, de forma geral, o SUS enfrenta dois grandes problemas principais. O primeiro é o baixo financiamento da União, bem inferior à real necessidade do sistema, que acaba pesando o orçamento de estados e municípios. E o segundo é a falta de organização.

A promotora afirma que o maior déficit do SUS é com relação ao número de leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), de internação psiquiátrica e também para usuários de drogas. “O Paraná não possui quantidade necessária de leitos de UTI para atender a todos os usuários”, afirma.

No final de janeiro, depois de apresentar complicações após uma cirurgia, uma paciente de 57 anos morreu no Centro Municipal de Urgências Médicas (CMUM), no bairro Sítio Cercado, após esperar quase 14 horas pela liberação de um leito no Hospital Evangélico. A Secretaria Municipal de Saúde abriu auditoria para investigar se houve falha no atendimento.

 

Subnotificações e mortes

Mortes causadas por problemas no atendimento médico ou falta de leitos são mais comuns do que se imagina no Paraná. Segundo Paula Brisola, delegada titular do Núcleo de Repressão aos Crimes Contra a Saúde (Nucrisa), ligado à Polícia Civil, em 2012 foram instaurados cerca de 300 inquéritos relacionados a problemas no atendimento de saúde da capital paranaense. Como o órgão atende somente casos ocorridos em Curitiba, estima-se que esse número seja muito maior em todo o Estado.

“O maior número de denúncias é de óbito materno-fetal, pronto atendimento, cirurgia bariátrica, cirurgia plástica, esta não com morte, lesão corporal e procedimentos cirúrgicos que apresentam problemas com a anestesia”, afirma a delegada.

Em 2009, a Universidade Federal do Paraná (UFPR) foi condenada a indenizar em R$ 700 mil a família de Marino Finetti Neto, de 26 anos, que morreu uma semana depois de passar por uma cirurgia no coração no Hospital das Clínicas (HC). O exame de necropsia encontrou uma gaze esquecida dentro do coração da vítima.

De acordo com os documentos, Neto procurou o HC em janeiro de 2003 para uma consulta e foi constatado um problema congênito no coração. Um mês depois, em 26 de fevereiro, ele foi submetido a uma cirurgia. O paciente chegou a receber alta no dia 7 de março, mas teve uma crise antes de sair do hospital. Neto foi internado na UTI, mas não resistiu e morreu.

 

Investigação médica

O Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM-PR) investiga todos os casos de erro médico quando encaminhados por denúncia. A sindicância dentro do órgão funciona como se fosse um inquérito policial.

“Analisamos os fatos, os documentos e pedimos esclarecimentos das partes. Feito isso, realizamos um juízo de valor inicial. Um conselheiro é nomeado para analisar toda a situação e fazer um relatório para verificar se existe ou não indícios de infração do código de ética médica. Uma comissão analisa esse relatório também”, afirma Alexandre Gustavo Bley, presidente do CRM-PR.

Terminada essa fase, o profissional de saúde denunciado é julgado dentro do próprio CRM. “Ele pode ser inocentado ou condenado. Se for comprovada a culpa do profissional, ele pode enfrentar diferentes penas”, afirma Bley.

A primeira pena é advertência confidencial, depois vai para a censura confidencial, censura pública, suspensão por até 30 dias do exercício profissional até a cassação. “Às vezes o caso é tão grave que não podemos partir de uma pena inicial. Numa situação dessas, podemos ir direto para a cassação”, diz o presidente.

Segundo o presidente, se houver um dano a algum paciente e for configurado que houve imperícia, imprudência ou negligencia é erro médico.

 

Público x privado

Paula Brisola, delegada do Nucrisa, destaca que não se pode afirmar que os atendimentos feitos através do SUS gerem mais problemas que a rede particular. “Talvez pontualmente encontremos problemas maiores na rede pública com relação a demora no atendimento e dificuldade de acesso ao atendimento”, afirma.

Mas quando falamos de atividade inadequada de profissional da área médica, acontece tanto no SUS quanto na rede particular, garante a delegada.

 

Erro e morte

Aos 80 anos, José Rodrigues Cabral era um homem saudável. Apesar da idade avançada e de todas as questões atreladas a ela, não usava nenhum medicamento regular. Ao final de 2007, foi fazer, através do Sistema Único de Saúde (SUS), uma colonoscopia no Hospital Evangélico, em Curitiba. A colonoscopia é um exame endoscópico que permite a visualização do interior do intestino grosso e a parte final do intestino fino. Como a maioria dos procedimentos médicos, a colonoscopia envolve riscos, apesar das raras ocorrências relatas em exames como este.

Reclamando de dores e sangue nas fezes, seu José retornou ao pronto-socorro do mesmo hospital poucos dias depois da realização do procedimento. O médico que lhe atendeu não identificou nada de anormal nas reclamações. “Ele foi dispensado com dores, sangramento, abdome distendido. Não era apenas um sinal, mas sim todas as evidências que havia ocorrido uma perfuração no intestino”, conta José Rodrigues Cabral Júnior, que é enfermeiro e filho de seu José.

No dia seguinte após ser liberado, ele retornou ao pronto-socorro. Não aguentava mais as dores. Depois de mais de nove horas de espera por atendimento, a perfuração no intestino foi finalmente identificada, mas era tarde. Seu José foi internado, passou por uma cirurgia, ficou dias na UTI, mas estava a cada dia mais debilitado e acabou morrendo em 21 de janeiro de 2008.

Desde então, a família luta na Justiça para provar que sua morte foi decorrente de um erro médico. Após várias respostas negativas e ausência de resposta de órgãos responsáveis, o filho de seu José está recorrendo no Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) com apoio do Ministério Público Federal (MPF).

 

Epidemia

Além da histórica preocupante superlotação de postos e hospitais e atendimento lento, os paranaenses enfrentam, desde o ano passado, uma epidemia de dengue em diversas regiões. O que mais preocupa é a introdução do tipo 4 do vírus no Estado, que circula inclusive entre pessoas que já foram infectadas com outros tipos da doença, e por isso, tende a ser mais grave.

Toda a população está suscetível ao soro tipo 4 da doença, o que facilita a disseminação da dengue em municípios com altos índices de infestação. Além disso, aumenta o risco de ocorrência de casos graves, como a febre hemorrágica por dengue ou dengue com complicação.

Nos últimos seis meses, o Estado teve 2.595 casos de dengue confirmados, o que representa uma média de 432 novos doentes por mês. Os municípios com maior número de casos confirmados são Peabiru (751), Paranavaí (664) e São Carlos do Ivaí (308).

Do total de casos, 2.383 são autóctones, ou seja, a infecção ocorreu no próprio município. Comparando com o mesmo período entre 2011 e 2012, houve aumento de 640% no número deste tipo de caso.

O coordenador da Sala de Situação da Dengue, Ronaldo Trevisan, reforça que o vírus da doença circula em diversas regiões. Ele admite que o número de casos de dengue pode aumentar. Segundo o secretário estadual da Saúde, Michele Caputo Neto, o Estado entra no período mais delicado em relação à dengue.


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