Cultura
03.09.2015
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03.09.2015
17.03.15
Vozes do Brasil
por Adriana Sydor
Suzie Franco - Foto: Reprodução/site consumodecultura.blogspot.com.br
Cris Lemos - Foto: Reprodução/site crislemosmusica.blogspot.com.br
Izabel Padovani - Foto: Reprodução/site tonsdobrasil.blogspot.com.br
Mônica Salmaso - Foto: Thaís Gallart
Paula Santoro - Foto: Ana Valadares
Fernanda Takai - Foto: Reprodução/site pipocatv.com.br
Maria Gadú - Foto: Reprodução/site x-presson.com
Renato Braz - Foto: Reprodução/site wscom.com.br
Rômulo Fróes - Foto: Reprodução/site funarte.gov.br
Marcos Sacramento - Foto: Reprodução/site digestivocultural.com

Há muito que este é um país de grandes vozes. Múltiplas vozes. Incríveis vozes. Tem quem cometa por aí a blasfêmia de negá-las no presente, a atribuir valor de interpretação apenas ao passado. Não! A boa música continua pulsante, viva, a emprestar sentimentos e palavras pra quem queira. Esforço único é o de atravessar a muralha da vulgaridade, e o mau humor e ignorância de sua sombra, para se encontrar com grandes tradutores.

Aqui mesmo, bem pertinho de você, num concerto em teatro ou numa canja de bar, é possível amansar os ouvidos em embalos de causar arrepios.

A Suzie Franco, por exemplo, que divide a rotina entre aulas, o vocal Brasileirão e O Tao do Trio. Difícil encontrar um agudo tão suave, carregado de emoção, técnica e coragem. Antes do conjunto de músculos, órgãos e todos os detalhes fisiológicos que acionam a voz, ela dispara o olhar e é depois dele que vem todo o resto, perfeito.

Igualmente competente, Ana Cascardo tem versatilidade tanto para colocar a voz como instrumento de uma formação como para ser crooner de baile, coisa que fez ainda menina, adolescente, intuitiva, antes de ter todo o respaldo técnico que lhe assegura lugar de honra no time das vozes.

Para citar só mais uma, Cris Lemos. Nasceu em São Paulo, mas para nossa sorte, foi aqui em Curitiba que passou a construir a carreira artística, que seguiu em paralelo da acadêmica, e formou legião de admiradores. Canta o que gosta e como gosta. E a plateia emudece.

Izabel Padovani, conhece? Se sim, você não vai querer ler minhas linhas a respeito, largará a revista e correrá para o aparelho mais próximo e desfrutará dos desassossegos que ela provoca; se não, não perca tempo e se entregue ao grave encorpado de sua voz.

Na mesma balada, a aclamada Mônica Salmaso. Ela rompeu a barreira do anonimato e hoje tem prestígio, reconhecimento, fama. Nem por isso relaxou com o cuidado e a seriedade da profissão, ao contrário, a cada ano, a cada novo trabalho, ela se mostra mais concentrada na qualidade, o que lhe permite hoje certa rendição à emoção, que a preocupação com a técnica no passado não lhe deixava.

Linda de olhar e de ouvir, a força de Paula Santoro está bem explicada nas palavras de Guinga: “De Madame Butterfly ao canto das lavadeiras, ao choro das carpideiras, na Clementina rouquidão de Satchmo e Nélson Cavaquinho, tudo não passaria de gritos e sussurros, sopros e silêncios porque a voz é apenas um instrumento. Mas o que faz a diferença – e aí Paula Santoro se inclui – é quando a voz é o instrumento e a vida é o argumento”.

Há aquelas que se vestem de ingenuidade para falar de coisa séria. Rhaíssa Bittar, por exemplo, que canta de brincadeira desde a infância, virou a página e tratou de se profissionalizar, estudar, ouvir, inventar, crescer.

É assim também a Fernanda Takai, que quase nos faz duvidar que deva ser cantora de verdade. Inteligente, ela sabe ocupar a voz que tem, sem firulas, sem grandes esticas, porque não lhe cabe. E reconhecer o próprio limite já é motivo para crédito.

Conheço gente que torce o nariz para Maria Gadú porque ela estampa grandes espaços da mídia, como se fosse um pecado mortal com o trabalho fazer sucesso. Ah! Ela canta bem direitinho e ainda bem que consegue elevar um pouco o nível das FMs por aí.

A profissão de intérprete parece cada dia mais rara. Na economia do mercado musical, compositores passaram a gravar suas próprias criações, acumulando cargos e salários. O que em alguns casos dá certo e une-se o útil ao agradável, em outros seria bem melhor que o ECAD funcionasse direitinho, para que todo mundo pudesse estar confortavelmente instalado em seu métier. Por exemplo, não dá para apontar para o Zeca Baleiro e lhe acusar como cantor. E muito de sua criação se perde quando ele mesmo ataca no microfone. Há uma diferença quilométrica em ouvi-lo em Bambayuque e compará-lo com Renato Braz na mesma composição.

Esse é o papel do intérprete, aquele que sabe decodificar tudo que está explícito e implícito com técnica e emoção. Eu, que não tenho medo de represálias, aproveito a oportunidade para citar Renato Braz como a grande voz masculina da atualidade. É, de fato, meu preferido.

Numa categoria do tipo completa, a abranger melodia, harmonia, instrumento e voz, figura Bruno Ruiz. Se ao ler esta matéria você tem tempo para apenas uma música, aconselho: escute, conheça e confira as possibilidades desse rapaz. É mais apontado como compositor, mas tem canto excepcional. 32 anos e muita estrada ainda pela frente. Até onde sei, “até o fechamento desta edição”, ele ainda não tem CD próprio, o que é curioso, triste e compreensível. Enquanto isso, Youtube.

Sem arrastar multidões ou provocar desmaios em fãs enlouquecidas, sem figurar nas rádios do país ou nos programas de TV, ele é bom e é para poucos, só para os atentos. Rômulo Fróes produz loucamente, compõe, canta, toca; tudo de um jeito independente e fiel às próprias descobertas e invenções.

Temos também Rubi, goiano estabelecido em São Paulo há mais de 20 anos. Ex-seminarista, encontrou na música sua escolha para a vida. Escolhe repertório apropriado para o seu falso falsete e vai derramando poesia pela voz.

E para fechar esta relação, o desinibido Marcos Sacramento, que namora com sambas antigos, que se arrisca em composições próprias e que começou carreira num grupo punk-rock. É intérprete de mão cheia, de propriedade das músicas que visita e apresenta. Ao lado de Renato Braz, ele é o titio dessa relação, este com 55 e o outro com 47. Ambos com muito de história já feita e muito ainda por fazer. 

Imagino que os amigos que me dão o prazer da leitura desta edição estejam a me crucificar por ter citado esses e deixado tantos outros de fora. Mas essa é uma relação que só tem a intenção de mostrar alguns gatos pingados de um conjunto grande, bonito, soberano e “anônimo” e provocar a busca de outros nomes.

É verdade que essa é a terra de Elis, Elizeth, Maysa, Francisco, Orlando, Mário. É verdade também que o pensamento comum faz parecer o passado melhor em qualidade. Mas não se engane, um lugar em que existem faróis como Aracy, Gal, Bethânia, Melodia, Ney, Milton não tem como não produzir grandes vozes. E as vozes do Brasil estão aí, para serem aproveitadas. Como diria a outra, a chata, procure saber.


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