Cultura
03.09.2015
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17.12.12
Décio Pignatari
por Fábio Campana

“— Curitiba é ótima para viver. Difícil para conviver.”


Frase de Décio Pignatari, poeta, escritor, professor, polemista, crítico, um dos criadores da poesia concreta ao lado de Augusto e Haroldo de Campos, que passou alguns anos de sua vida em Curitiba.

Veio a convite de Cassiana Lacerda, que lutava para reunir inteligências ao criar o curso de design na Universidade Federal do Paraná.

Ela o convenceu a adotar a cidade e a aceitar o desafio logo que Pignatari se aposentou da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP. Mais tarde ele passou a dar aulas no mestrado em Comunicação e Linguagem da Universidade Tuiuti.

Foi uma bela experiência para Curitiba albergar uma figura como Décio Pignatari. Logo ele estabeleceu uma relação de amor e de observador crítico da cidade.

— Vivo em tranquila solidão, diante do big brother Niemeyer.

Referia-se ao olho do Museu Oscar Niemeyer, que via da janela de seu apartamento. Quanto à solidão, nem tanto. Fez boas amizades em Curitiba. Vilma Slomp, que o fotografou e que o próprio Décio considerava a autora do seu melhor retrato. Com ela fez outros trabalhos que resultaram livros.

Da cidade guardou o gosto pelas caminhadas diárias nos parques que o mantinham em forma. Sempre o mesmo trajeto. Passava pelo mural de Rogério Dias, no Centro Cívico, que considerava o único que merecia ser visto. A estátua de Rio Branco, no Largo da Ordem, para ele a melhor que se fez do Barão no País.

A sua peça Céu de Lona, editada pela Travessa, foi ilustrada por Maria Ângela Baptista e o resultado foi tão do gosto de Pignatari que ele pensava produzir com ela as duas peças seguintes.

Tivemos sorte. Uma de suas referências passou a ser a Travessa dos Editores, que visitava no mínimo uma vez por semana e onde desenvolveu trabalhos importantes como a coordenação da edição comentada de “Catatau”, de Paulo Leminski, e a tradução e edição bilíngue do livro “Marina”, com a poesia de Marina Svetaia, poeta russa que poucos conheciam no Brasil.

Tinha vontade de preparar a edição de alguns livros. A poesia de Josely Vianna Batista, o romance de Dionélio Machado, “Os Ratos”, e de sua própria lavra, a poesia e a teoria.

Era, para nós, um aporte de outra cultura, outra visão sobre arte, de um permanente polemista que nos instigava a refletir sobre a vida cultural na periferia brasílica.

— No Brasil, você sempre caminha para uma coisa que é muito pobre. Faz-se literatura comparada, mas se foge como o diabo da cruz dos juízos de valor. E, principalmente, os estudos que fez sobre Kirkegaard, na biblioteca deixada pelo professor Reichmann na Universidade Federal do Paraná.

Vanguarda? Só sobrou uma para ele. A da moda. Gostava de ver todos os desfiles de moda na televisão.

— Aquelas roupas incríveis e todo mundo se pergunta: mas ninguém vai vestir isso? Justamente essa moda é uma linguagem de vanguarda. Logo vão acabar com ela também.

Esse homem inquieto, sofisticado à sua maneira, sofreu hostilidades no ambiente provinciano. Os estetas de segunda linha temiam a invasão de suas ideias em seus territórios duramente preservados. Uma pena. Pignatari poderia ter deixado mais ainda em Curitiba. Agora é tarde. Morreu no começo de dezembro depois de longa enfermidade que lhe tirara o principal, a memória e a capacidade de pensar e polemizar sobre tudo.


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