Política
03.09.2015
03.09.2015
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03.09.2015
12.07.13
O ronco das ruas
por Ângela Chiarotti Fotos Pablo D Contreras

A maioria da população apoia as manifestações populares que tomaram as ruas nas duas últimas semanas.

Fotos Pablo D Contreras
Fotos Pablo D Contreras
Fotos Pablo D Contreras
Fotos Pablo D Contreras
Fotos Pablo D Contreras
Fotos Pablo D Contreras
Fotos Pablo D Contreras
Fotos Pablo D Contreras
Fotos Pablo D Contreras

A maioria da população apoia as manifestações populares que tomaram as ruas nas duas últimas semanas. Mas apenas 6% dos entrevistados pelos institutos de pesquisa participaram dos protestos e 35% dos que não foram iriam. Esses são alguns dos resultados de uma pesquisa exclusiva da CNT e do Ibope, que revelou a opinião dos brasileiros sobre os atos, sobre as atuais e futuras condições de vida no Brasil, sobre os políticos e eventos como a Copa do Mundo de 2014.

Apesar de a maior parte dos brasileiros ser a favor dos protestos, 69% se diz satisfeita com sua vida atual e tem expectativas positivas sobre o futuro do País (43%). Há, no entanto, uma deterioração das expectativas. A mesma proporção de brasileiros (43%) está menos otimista com o futuro do que há dois anos.

Delfim Netto, com seu brilhantismo e poder de síntese habituais, resumiu a um interlocutor o motivo dos protestos: “Os governos não atenderam às prioridades da população. Ela queria metrô, não estádios. O povo recusou as prioridades dos governos. É tão simples quanto isso”.

Tudo começou como um movimento radical da esquerda: na primeira passeata em São Paulo, militantes do MPL, PSTU, PSOL e PCO, com bandeiras, estavam à frente, bloqueando a Avenida Paulista. O MPL, Movimento Passe Livre, foi criado pelo Fórum Social Mundial, organização assumidamente de esquerda, na reunião de 2005.

O domínio de internet usado pelo MPL pertence a uma ONG próxima ao PT, Alquimídia, que recebe recursos da Petrobras e do Ministério da Cultura e até o início das passeatas trazia no site os símbolos governamentais.

Mas o movimento caiu no gosto do público e atraiu gente que não tinha nada de esquerdista: queria protestar contra a corrupção, o desperdício do dinheiro público, o custo da Copa, os gastos de parlamentares, o Mensalão, os problemas da saúde, problemas sempre associados ao governo.

O que era para ser um movimento contra a alta das tarifas virou ponto de encontro de descontentes com o governo e o PT – a ponto de manifestantes se reunirem em frente à residência de Lula, em São Bernardo (SP), gritando insultos, e de manifestantes se concentrarem diante da residência do prefeito petista Fernando Haddad, em São Paulo.

O radicalismo antipetista chegou a acusar a Globo de estar a serviço do PT. É sensível a queda de prestígio do governo. Ruim: este é o governo que temos, gostemos ou não, e que até o fim de 2014 tem a tarefa de gerir o País.

O bumerangue foi e voltou, atingindo quem se sentiu esperto ao ter a brilhante ideia de lançá-lo. Como diz o provérbio iídiche, o homem planeja e Deus ri.

 

Quem vai às ruas

Cerca da metade das pessoas nas passeatas, 46%, nunca tinha participado de uma manifestação de rua. 89% das pessoas disseram que não se sentem representadas por qualquer partido político; 83% dos manifestantes entrevistados não se sentem representados por qualquer político; 96% não são filiados a partido político.

Tudo começou por causa do aumento das tarifas no transporte público. Mas existe muito mais que isso nas bandeiras, nas faixas, nos cartazes e também nas vozes que falaram bem alto durante os protestos que começaram há duas semanas.

As ruas do Brasil carregaram uma avalanche de insatisfações e reivindicações. O pedido era só um. A pesquisa do Ibope comprovou. Quando perguntados sobre as razões de estarem protestando nas ruas, o grupo mais numeroso, 38% dos entrevistados, apresentou motivos ligados à questão do transporte público. E 28% dos manifestantes se declararam contra o aumento das tarifas.

O aumento das passagens foi o estopim. Mas à medida que as ruas foram ficando cheias, elas também se tornaram um caldeirão de reivindicações e de protestos. Para outros 30% dos manifestantes, a principal razão de protesto não era o transporte público, era a política. E 24% disseram que estavam nas ruas contra a corrupção.

Outros motivos de protesto considerados prioritários pelos manifestantes na pesquisa do Ibope: em defesa da saúde, 12%; contra a PEC 37 - a medida que tira do Ministério Público a atribuição de realizar investigações criminais - 6%; 5% contra os gastos com a Copa do Mundo; e outros 5% pela educação.

Mas quando o Ibope leva em conta não apenas a primeira, mas as três primeiras respostas dadas espontaneamente pelos manifestantes, o transporte cai para o segundo lugar.

A política aparece em primeiro, com 65%. A questão política mais citada foi a corrupção, apontada por quase a metade dos manifestantes como motivo para protestar. A soma dá mais de 100% porque o mesmo entrevistado podia apontar três motivos.

A pesquisa Ibope revelou que 46% dos manifestantes acham que o governo tem que arcar com esse custo; 29% disseram ao Ibope que a conta deve ficar com os empresários; e 21% acham que ela deve ser dividida entre governo e empresários.

A grande maioria dos manifestantes, 66%, disse que depredações de bens públicos e privados nunca são justificadas; 28% responderam que essas ações são justificadas somente em certas circunstâncias. E apenas 5% consideram que depredações são sempre justificadas; 1% não soube responder.

Cinquenta e sete por cento dos entrevistados pelo Ibope, no Rio e em mais sete capitais, disseram que a polícia agiu de forma muito violenta; 24% afirmam que foi violenta, mas sem exageros; 15%, que a polícia agiu sem violência; e 4% não souberam ou não quiseram responder.

No embalo das manifestações promovidas por grupos não organizados da sociedade, a Ordem dos Advogados do Brasil e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) lançaram uma campanha de coleta de assinaturas para pressionar o Congresso Nacional a votar parte das reivindicações identificadas nos protestos que se espalharam pelo País nas duas últimas semanas.

 

A desilusão petista

O PT nunca amargou desilusão tão profunda: as ruas se abarrotaram de gente sem que o partido as mobilizasse. Gente que, em sua maioria, prefere que a “onda vermelha” convocada, oportunista e extemporaneamente, pelo presidente da sigla Rui Falcão, fique longe.

Golpe duro para quem sempre se vangloriou da sintonia com as massas, de ser o senhor das vozes das ruas. Que se arvorava a ser quase, senão o único, na interlocução com os jovens. Que paga centenas de blogueiros, sabe-se lá quantos tuiteiros e facebuqueiros para falar bem do governo e rechaçar opiniões contrárias. Mas que não foi capaz de nem mesmo sentir o cheiro da mobilização, via redes sociais, que nas duas últimas semanas sacudiu o País de ponta a ponta.

É fato que nenhum partido, pouquíssimos políticos e só alguns analistas conseguiram traduzir, pelo menos parcialmente, o que está se passando. Mas, para o PT, estar divorciado disso, não ser o dono da voz, é quase mortal.

Tanto que se expõe ao rechaço enfiando-se em manifestações que, pelo menos por enquanto, agremiação ou político algum é bem-vindo. Até porque os partidos políticos – mais preocupados com os seus umbigos e com a eleição seguinte – são alvos da grita.

Estar apartado disso é tão letal para o PT que fez seus dirigentes esquecerem os disfarces habituais. No olho do furacão, enquanto o prédio da Prefeitura de São Paulo era vandalizado e o prefeito Fernando Haddad deixado nu, lançado à sua própria sorte, a presidente Dilma Rousseff reunia-se com o seu inventor Lula, o marqueteiro João Santana, o ministro Aloizio Mercadante e Rui Falcão.

Na pauta, o PT e a manutenção do poder depois do estouro da boiada – da qual eles se imaginavam donos – falavam mais alto do que o País. O petista Haddad abrigou-se ao lado do tucano Geraldo Alckmin e, juntos, anunciaram a suspensão do reajuste das tarifas de ônibus, metrô e trens. No dia seguinte, quinta-feira, ambos colheram uma manifestação em paz, que ocupou toda a Avenida Paulista.

Dilma só falou ao País um dia depois de a “pequena minoria” – esse pleonasmo que deixou rastros de destruição em dezenas de centros urbanos – fazer estragos diante de seus olhos, importunando-a no Palácio do Planalto, ameaçando o Congresso Nacional, ateando fogo e quebrando os vidros do Palácio do Itamaraty.

Seu pronunciamento foi correto no tom, medido, bem escrito. João Santana teria acertado em tudo, não fosse o deslize costumeiro de, mais uma vez, colocar o PT antes do País; de anunciar um pacto nacional com a pauta da campanha eleitoral já desenhada para 2014. De amenizar, mas não eliminar a soberba.


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